quarta-feira, 29 de junho de 2022

Um local limpo

 

 

Um sítio limpo

Queria encontrar e não consigo

Para viver

Longe da poeira da verborreia constante

Do lixo tóxico de balofas opiniões

Da porcaria das certezas sobre tudo

Do esgoto que é o novo-riquismo

Da lama difamatória

Um sítio limpo

Que vou continuar a procurar

Tentando não pisar tudo

Para viver sem me contaminar

Sabendo não ser fácil

Porque só são três

As divisões na reciclagem.

domingo, 26 de junho de 2022

Contingências

 

Vejo o escorrer da vida

Quando em dia de chuva

Olho os escorridos vidros de uma janela.

Sinto a vida a pingar

Quando descuidado e de peito aberto

Assumo ao exterior do meu abrigo.

Vejo a vida voar

Quando a imagino no alto

À boleia nas asas de uma gaivota.

Sinto o ruir da existência

No abafado trovão ensurdecedor

Que se despenha no alto mar.

Vejo os cruzamentos da vida

Do interior gradeado

Na prisão dos limites impostos.

Sinto o tenaz aperto

Da vida agrilhoada

Numa liberdade só dita.

Vejo e sinto o viver num cadinho

Que na fornalha derrete a matéria

Para moldar uma nova vida.

 

 

 

sexta-feira, 24 de junho de 2022

Da forma como se usa. A Palavra

 

A palavra

 

É máquina de terraplanagem.

Corta.

Abre sulcos ou alisa

Conforme o gume da lâmina.

Arrasta e impele

Pisa e eleva

Separa e aglutina

Amontoa e desfaz

Une e desprende

 

A palavra pode ser

 

Ruído ensurdecedor

Silencioso conselho

Explosão de raiva

Terno murmúrio

Fúria incontida

Suave afago

Abraço amigo

Arma de arremesso

Ou disparo mortal.