sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Agradecimento

Um ano é já passado
Desde que de entranhas rasgado
E dormindo sono profundo
Nas mãos sábias da cirurgia
Me entreguei naquele dia
Para acordar de novo para o mundo.

De coração apertadinho
Mas sorrindo e rezando baixinho
Por uma esperança alicerçada
No “Amigo” sempre presente
Numa equipa eficiente
Que me devolve à vida almejada.

Agradeço por renascer
Mesmo aquando do sofrer
Vivia a vida em cada dia
Em cirurgia internado
Ou no tratamento ministrado
No paraíso em oncologia.

Rodeado de anjos com bata
Sempre irei lembrar esta data
Enquanto Deus permitir
Desde que de entranhas rasgado
Um ano é já passado
Mas o caminho é para seguir.

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Despertar sempre adiado

Só a consciência que vivo no deserto
Me lançará na busca de um oásis.

Só quando me encontrar num revolto e medonho mar
Vou desejar um porto de abrigo.

Só quando experimentar a sede que mata
Vou lamentar a água desperdiçada.

Se a minha vida for negra noite
Um pequeno raio de luz me parecerá dia.

Até quando Pai este meu entorpecimento?
Será que algum dia irei acordar?

Desperta-me Senhor para a tua presença constante
Para que eu possa arrepiar caminho
E descobrir em Ti

A verdadeira luz que me guia nas trevas
O verdadeiro porto de abrigo
Que me fará entrar no oásis
Onde a pura água que és Tu
Jamais seja desperdiçada

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Obstrução

Sentado à sombra do plátano
Na margem do pequeno mas lindo rio ovil
Sem o intuito moralizador
Vejo no seu leito um exemplo.

Dois fios de água às margens relegados
O centro totalmente obstruído
Pedras, areia, amontoado de ramos
Entulho por fartas águas arrastado.
A maravilha é ver na pouca água
A sua limpidez e frescura
Segura do seu caminho
Confinada à margem, mas esguia
Caminho difícil mas continuo-o
Contornando obstáculos mas persistente
Desliza como ouro
Ao encontro de solos por fertilizar
O lixo, esse, continua imponente
Num trono de areia movediça
Pouso soberano que ruirá
Quando o caudal crescer
Então as águas retomarem o que é seu por direito
Acabando a imponência do lixo
Cedendo a corrente que por ora ele despreza.

domingo, 18 de agosto de 2013

O quadro da vida

Pintar um quadro sem ser pintor
Pode não ser arte
Mas é prova de amor.

Todos temos as tintas
Os pincéis e a paleta
O quadro vai sendo pintado
Cada qual sua faceta
Com guache ou a carvão
A óleo ou com relevo
Importante é o coração
Paisagem sempre em segredo
A Graça que Deus nos dá
De nosso quadro pintar
É exaltação na vida
É a força de lutar
Pinceladas são alegria
Outras são de sofrimento
Pintamos a vida com cores
 Em moldura de sofrimento
Pintar um quadro com “Graça”
Nome de nosso batismo
É viver o dia a dia
Em Deus, nossa força e heroísmo.


Para a Graça, de Baião em 15-8 2013 (doente oncológica)

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

O espaço que se ocupa

Algum é de todos.
Espaço livre
Outro diz-se ser de cada um
Mentira… Nem todos têm o seu espaço
Enquanto alguns usurpam o que não lhes pertence
Outros são confinados a espaço restrito
Se esbracejam demais são jogados para fora
Atirados no espaço
“Cada um tem o seu espaço”
Há o que é reservado e com alguma reserva se concede
Outro há que não sendo muito reservado
Apresenta algumas reservas
Concede-lo é educado
Mostra educação quem guarda espaço
Há quem tendo muito espaço em área
Vive sempre condicionado
Com muitos intervalos na vida, com muitos espaços
Estar no nosso espaço
No nosso lugar
Pode levar a ter consciência do mesmo
Questionado na sua valia exterior
No interior é essencial
Cuidar do espaço é cuidar da vida
Dar espaço à vida é viver sem interregno
É viver cada dia com amplo espaço.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Estações

Despertei com chuva, ouvindo notícias de Inverno.
Gentes fustigadas por temporais destruidores.
Assoladas por ventanias de miséria.
Lama de fome entrando pelas brechas das paredes abaladas.
Ideais voando nos talhados arrancados pelo forte vento.
Corpos mirrados pela trovoada que cruza os céus, ultimo bastião da esperança.
Quando surgirá Abril?
Para quando a Primavera?
Até quando soprará o autoritário ciclone?
Quanto tempo durará a tempestade do cifrão?
Despertei com chuva desejando uma aurora solarenga, que me faça regressar a um verão mesmo fingido, para voltar à liberdade hipócrita que me concedem, se…
E depois virá o tempo outonal, das folhas caídas, dos frutos maduros, colhidos para as mesas dos ricos, donos deste pobre pomar.
“A desgraça de uma nação pobre é que em vez de produzir riqueza produz ricos” (Mia Couto).
Por isso o sol não brilha para todos, e continua o Inverno chuvoso, para quem precisa de calor nos estômagos vazios, para quem necessita de bonança numa vida sem teto.
“A ameaça da morte pela fome, lança o homem contra o homem, e os cidadãos contra os seus governantes” (Johnsom).
Para quando a primavera? Hoje ainda despertei com chuva, e o céu carregado de negro não agoira tempos melhores.
Quem dera uma manha de nevoeiro, em que surgisse por entre a bruma, não o histórico Sebastião, mas outro Rei, o farol dissipador.
O amor em forma de cruz, o raio fulminante do exemplo de serviço.
Até podia despertar de novo com chuva.
Até podia ser Inverno.
Mas teria o calor da esperança, na espera do sol do verdadeiro verão.

sábado, 3 de agosto de 2013

Por trás da porta

Sair à rua no contacto com o exterior
É ousadia guerreira.
Usar como escudo a porta aferrolhada
É travo amargo de uma vitória sem luta.
Grandes lutas por pequenez de objectivos
Tanta efervescência para tão rasteiras labaredas.

Por trás da porta…
Os dramas se mistificam ou são embuçados
Teimosa manutenção das dores da resignação.
Chispas escaldantes que saltam da apatia
Num coração corroído de medo.

Por trás da porta…
Esperando a razão para a razão
De um exílio voluntário.
Quando a razão for colectiva
Duplicará em força
Força que derrubará todos os muros
E fará ruir todas as portas.