quinta-feira, 30 de agosto de 2018

Escaldante calor

Há outro calor que mais gosto
O do conforto interior
Não o calor do tempo
Este inferno imaginado
Que me deixa derrotado
Destruído fisicamente
Como casa depois de um tornado
O suor no rosto é sangue salgado
Que me encharca e tolda
Que me ofusca e tisna
Até quando esta luta
Entre o querer e não poder
Entre o estar e não ser
Exister e saber morrer
E sem fazer por merecer
Ficar
Permanecer
Ter porta aberta e não sair
Ter mala feita e não partir
Porque a etapa não terminou
E tempo que me ficou
Mesmo com calor infernal
É de viver e não fugir.

sábado, 25 de agosto de 2018

Ilusória vida

Nada nem ninguém neste mundo
Faz tanta falta ao outro
Como o afeto que lhe possamos dispensar.
Só que a complexidade humana
Transforma o que lhe traz felicidade
Em causa de desventura.
A nossa loucura leva-nos a ir à procura
Por vezes a longínquos lugares
Quando o que nos é necessário
Vive bem perto e nos toca a todo o instante.
Os nossos estreitos limites
Levam-nos a usar as nossas energias
Faculdades e inteligência
Esgotando todas as forças
Em satisfazer algumas necessidades 
Que achamos imprescindíveis.
Quando as conquistamos
Vemos que aquilo que achávamos como necessário
Só tende a prolongar a nossa miserável existência
Porque o essencial nunca foi por nós procurado.

terça-feira, 21 de agosto de 2018

Cada problema sua solução

Todo o problema tem o seu fim
Se a solução dependesse de mim
Por certo algo faria
Seria o melhor? Se calhar não
Mas por tentar a solução
Garanto não ficaria.

Os problemas cozinhar
Deixa-los a marinar
E não os tentar resolver
É dispêndio de energia
Se deixados para outro dia
Azedam sem se comer.

Enfrentar mesmo que custe
É resistir ao embuste
De a si próprio enganar
Quero crer melhor seria
E a dor que sentiria
Mais leve se iria tornar.

domingo, 19 de agosto de 2018

Vivendo como a vida é

Como nómada
Numa tenda
Vejo chegar a noite
Noite términus do dia
Não a escuridão
Não o negro do coração.
O buliço do dia dá lugar à calma
A calma repousante
Que convida à reflexão
A noite silenciosa
Que permite ouvir a corrente suave do rio
Esguia e apressada por entre pedras
A correr sem vacilar
Fazendo caminho que ninguém vai mudar
Deserto gratificante
Que fortifica e leva à paz
Mostrando a forma capaz
De algo fazer sem barulho
Sem alardes nem pompa
Sem esperar o convite
Missão que sendo aceite
Deve ser realizada
Mesmo gastando a vida
Não esperando contrapartida
Mesmo no fim da jornada.

domingo, 5 de agosto de 2018

Novamente o silêncio

“O erro da pessoa é pensar que os silêncios são todos iguais” (Mia Couto)

O silêncio que ninguém cala
O silêncio contestação
Do respeito
Da admiração
O silêncio gritante
O silêncio interrogação
Do questionamento
Da reflexão
O silêncio que fere
O silêncio irritação
Do incómodo
Da afetação
O silêncio do calado
O silêncio sem afirmação
Do engolir em seco
Da não aceitação
O silêncio da escuta
O silêncio como regra seguida
Do louvor permanente
Da vida vivida.